Se eu me demorar demais olhando Paysage aux Oiseaux Jaunes (Paisagens com Pássaros Amarelos, de Klee), nunca mais poderei voltar atrás. Coragem e covardia são um jogo que se joga a cada instante. Assusta a visão talvez irremediável e que talvez seja a da liberdade. O hábito que temos de olhar através das grades da prisão, o conforto que trás segurar com as duas mãos as barras frias de ferro. A covardia nos mata. Pois há aqueles para os quais a prisão é a segurança, as barras um apoio para as mãos. Então reconheço que há poucos homens livres. Olho de novo a paisagem e de novo reconheço que covardia e liberdade estiveram em jogo. A burguesia total cai aos se olhar Paysage aux Oiseaux Jaunes. Minha coragem, inteiramente possível, me amedronta. Começo até a pensar que entre os loucos há os que não são loucos. E que a possibilidade, a que é verdadeiramente, não é pra ser explicada a um burguês quadrado. E à medida que a pessoa quiser explicar se enreda em palavras, poderá perder a coragem, estará perdendo a liberdade. Les Oiseaux Jaunes não pede sequer que o entenda: esse grau é ainda mais liberdade: não ter medo que não ser compreendido. Olhando a extrema beleza dos pássaros amarelos calculo o que seria se eu perdesse totalmente o medo. O conforto da prisão burguesa tantas vezes me bate no rosto. E, antes de aprender a ser livre, eu agüentava – só para não ser livre.
LISPECTOR, Clarice (A Descoberta do Mundo).
3 comentários:
Maravilhoso seu espaço.....ou melhor o espaço que você criou pra Ela.
Esse texto mudou minha vida:aprendi a ser livre!
Vou voltar sempre
Querida amiga que bom tê-la novamente entre nós, estou muito feliz sabendo que vc está bem melhor, senti sua falta.
Muito linda sua homenagem a essa grande mulher gosto muito dela e de Cecília Meireles.Vou vir sempre amiga sabe que te gosto muito e sei que tudo que fazes é belo.Um beijo em seu coração.
Ah, meu novo endereço agora é esse tá?
Um lindo domingo e fique com Deus.
clarice apenas foi cincera, e nisso conciste o brilho de sua obra, ela disse aquilo que nao consequimos dizer e isso nos
encanta, comove, atrai.
18 janiro de 2008.
Postar um comentário